Tempo Coberto, desde 1930.
Locais: Belo Horizonte, Rio de Janeiro - Brasil.
Após a morte de minha mãe, no começo de 1987, eu fui a única dos seus três filhos que teve a coragem de organizar todas as suas coisas. Eu, Anastásia, examinei cuidadosamente todas as lembranças que enchiam muitas gavetas de seu quarto em nossa casa, conhecida como a Chácara. Estar nesse lugar onde sempre moramos era como estar com ela novamente, e assim isso me ajudou a preencher o vazio que sua morte havia deixado em mim.
Quantas vezes no passado eu havia feito isso - olhar as coisas dela? Lembro-me das várias vezes que lhe pedi se podia olhar através de suas lembranças, o que invariavelmente provocava uma sequência de perguntas sobre suas memórias. Ela se sentava ao meu lado e me respondia com a sua calma habitual, que era tão característica dela. Eu sempre amei navegar pelo passado. Deve ter sido um sinal latente da escritora que me tornei.
Montanhas de Minas Gerais, Diamantina e Mapa de Minas Gerais localizando Diamantina.
Nessa ocasião, quando minha mãe lá estava somente em espírito, encontrei um caderno antigo com o nome dela – Clara Deméter Cattapreta. As inscrições nele eram datadas de 1932 a 1936 - quatro anos de sua juventude. Isso foi quando ela colecionou poemas, dos 16 aos 20 anos, dois anos antes de se casar com o meu pai.
Supus que minha mãe pedisse às amigas que transcrevessem seus versos favoritos, pois os vários poemas eram escritos em letras diferentes e com a assinatura de nomes que eu não reconhecia. Em muitos casos, não consegui descobrir os autores dos poemas, enquanto alguns eram bem conhecidos.
As duas últimas entradas do caderno foram escritas com a letra de meu pai, assinadas por ele e datadas de 1934. Eu reconheceria a letra dele em qualquer lugar – como o pequeno escrito de médico, se isso existe. Li os poemas de meu pai com grande interesse e, para minha surpresa, um deles me lembrou uma história que ele costumava me contar na hora de dormir, quando eu era muito pequena. Essa história sempre me fazia chorar porque eu a achava muito triste. Não tenho ideia de quem escreveu originalmente esse poema, embora tenha tentado descobrir.
A Canção do Marinheiro
O triste marinheiro deixa
Memorial em sua terra,
Leva com ele esperança
E também seus pesares.
Então, nestas páginas,
Eu deixo o meu nome.
Se nas ondas da vida,
O meu próprio barco
For perdido comigo,
Quando isso ler
Lembre-se do marinheiro
E diga adeus.
Autor desconhecido
Foi dedicado a Clara Deméter,
então sua namorada, e assinado por Antônio Zeus Rezende de Luciânia. O meu pai tinha então 21 anos e era apenas um estudante de medicina pobre, que morava no que era chamado de uma ‘república’. Esse ainda hoje é
o nome dado a um tipo de acomodação barata para jovens estudantes cujos pais moram fora da cidade. Minha mãe tinha 18 anos na época em que meu pai transcreveu esse poema, e ainda terminava o ensino médio no Colégio
Santa Maria, um estabelecimento de ensino tradicional e muito conhecido em Belo Horizonte.
Minha mãe e seus pais moravam em um endereço elegante na Avenida João Pinheiro, perto da Praça da Liberdade, onde se situa o Palácio da Liberdade, sede do Governo do Estado. Meus pais já se conheciam havia cerca de dois anos, de acordo com as histórias que ouvi de minha avó materna, Teresa. E eles se casaram em 1938, quando a carreira comercial do meu pai ainda não havia começado. Esse era ainda para eles um tempo de ilusões e sonhos.
Minha memória aguçada é uma ferramenta maravilhosa para uma escritora. Eu me lembro de tantas coisas! O bom e o ruim permanecem na minha mente consciente como um livro de história organizado, com pequenos detalhes, emoções, imagens e sons, exatamente como eles aconteceram. Meu pai me contou essa história sobre o marinheiro há mais de sessenta anos, e eu ainda reajo à lembrança de ouvi-la da mesma maneira em que reagi na época. Sinto-me entristecida com a separação do marinheiro de sua família. Esse sempre foi o nosso problema. Meu pai e eu éramos tão parecidos! Nós dois éramos muito emotivos.
Meninas pequenas frequentemente são fascinadas por seus pais, assim como os meninos por suas mães. Meu filho passou anos me olhando com adoração, dizendo: "Mamã, você é linda", que ele pronunciaria boroful antes de aprender a falar corretamente.
Mesmo quando bebê, eu era apaixonada por meu pai e, quando ele me contava a história do marinheiro, minha mãe dizia a ele: “Que estranho hábito em sua família de contar histórias tristes para as crianças que as fazem chorar!" Pelo que me lembro, a história foi assim: certa vez, um marinheiro costumava cantar enquanto trabalhava em seu barco às margens de um grande rio. Em sua casa, a sua filha pequena sempre se sentia muito tranquila com o som da voz do pai à distância. Ela a ouvia isso todos os dias, no início da manhã e novamente antes do pôr do sol, quando ele voltava. Um dia ele não voltou e houve silêncio para sempre. Algo aconteceu com o marinheiro e ele nunca mais voltou para casa.
Quando ouvi essa história – naturalmente associei meu pai ao marinheiro –, ficava muito perturbada e dizia: "Oh, papai, nunca vá embora!" Lembro-me claramente da minha imagem mental da história em que o porto onde o marinheiro mantinha seu barco estava no fundo de um penhasco, e não podia ser visto de sua casa, mas a sua voz cantada o mantinha ligado à amada filha. Tentei me lembrar do resto da história, mas eu era muito jovem, provavelmente com menos de três anos, como posso ver nas fotos das férias da família na casa de campo dos meus avós, as Guaritas. Pois é aí que me lembro de meu pai me contando essa história.
Embora não pensasse nisso há muito tempo, quando decidi digitalizar o pequeno poema que encontrei no caderno de minha mãe, chorei mais uma vez porque o marinheiro havia sido sequestrado ou porque sentia falta do meu pai.
Meu pai, Antônio Zeus, nasceu em 1913 e cresceu naquela linda casa de campo antiga conhecida como As Guaritas, perto de São Gotardo, em Minas Gerais. Outro poema que ele transcreveu no caderno de minha mãe é rico em imagens de sua juventude.
A vida
A vida, que vem a ser?
Na infância; Aurora florida,
Gorjeios da passarada,
A irrequieta meninada,
Sorrir, brincar e crescer!
Mais tarde, no verão,
Meio dia, sonhos de amor;
Sonhos viris;
Sem alarde,
No silêncio,
Agir, lutar e vencer.
Depois, velhice.
Lembrar, perdoar,
Esquecer, solidão,
Sozinho, ou a dois,
Nuvem que se esgarça,
Véu errante de fumaça,
Pesares, noite, morte!
Autor desconhecido
Neste livro, eu pinto um quadro de meu pai como eu o vi, semelhante à maneira como ele era visto pela maioria de nossa família, avós, tios e primos. Meu pai também era respeitado e admirado por aqueles que trabalhavam com ele no escritório e na refinaria, ou nos arredores de nossas casas de campo. E este é, portanto, seu verdadeiro eu, uma pessoa carinhosa, sensível e emocional.
Mas nem sempre era assim que os outros o viam. E esses podem ter sido apenas conhecidos ou relacionamentos que ele tinha longe de nós, ou estranhos que só ouviram falar dele como uma pessoa conhecida localmente por sua riqueza ou por ser mulherengo. Portanto, o retrato que traço dele difere muito do mito criado ao seu redor, de boca em boca ou pela imprensa. Mas a maioria das pessoas que falou mal dele realmente não o conhecia, mas embora estivesse ansiosa para julgá-lo.
Quando escrevo sobre o mal-estar que existia entre meu pai e muitas pessoas da cidade, percebo que tenho tendência a escrever em enigmas. Eu realmente gostaria de não ter que escrever sobre coisas desagradáveis, pois isso me machuca. Mas devo lembrar que muitos de meus leitores serão estranhos, alguns dos quais nem ouviram falar da cidade de Belo Horizonte, localizada em um vale no continente sul-americano. E, novamente, a maioria das pessoas não saberá como ou por que, no século 20, nós nos tornamos notórios localmente. Essas pessoas perguntarão o que causou essa notoriedade persistente e incomodativa.
Minha resposta é que acredito que foi uma combinação de fatores, como a riqueza de meu pai, sua tendência infeliz de mulherengo, o fato de tantas mulheres desejarem ser engravidadas por ele para que seus filhos tivessem uma parte de sua herança, e talvez um toque de sua excentricidade. Mas nunca de qualquer crime. Não, meu pai não era um criminoso.
Eu amava meu pai e minha mãe, mas logo achei muito difícil morar naquela cidade, pois achava nossa notabilidade incômoda. Tradicionalmente, os filhos devem pagar pelos pecados do pai. É inevitável. Mas achei o fardo muito pesado e, depois da universidade, decidi não morar mais lá. No entanto, agora volto a fazer através de minha obra o papel de defensora do meu pai!
A filha pródiga que optou por suas próprias escolhas na vida volta para defender a reputação de seu pai, relatando sua história de vida do ponto de vista de sua própria família. É sobre isto que me refiro no meu poema temático:
O Brado da Guerreira
Eu não serei vencida!
As palavras que uso em minha batalha
Viverão para sempre, e as pessoas escutarão
A minha voz até a vitória da verdade.
© A.L.P. Gouthier, 2013
Eu abraço esta missão com amor no coração por todas as lembranças dos bons tempos que tivemos e pela memória da devoção e cuidado de pais que me adoravam. Todo o veneno do mundo não pode mudar isso!
Minha mãe e meu pai se conheceram em 1930, quando tinham 15 e 18 anos, respectivamente. Meu pai era então um estudante de medicina, cuja família passava por um período de dificuldades devido ao colapso econômico da década de 1930, que fez o preço do café despencar.
Como minha mãe estava na mesma escola que a irmã de meu pai, Naytres, é muito provável que eles se conheceram lá, quando meu pai foi buscar sua irmã na escola. O namoro deles era o relacionamento inocente de sempre, típico dos jovens respeitáveis da época. E eles se casaram em 1938. Atualmente, as pessoas se esquecem que as jovens sensatas, mesmo na minha geração, eram na maioria castas e inocentes.
Nos anos 1990, a TV Globo fez um seriado intitulado Hilda Furacão. Essa era uma mulher de Belo Horizonte que, no final da década de 1940, abandonou sua antiga vida para se tornar uma cortesã, e que se tornou famosa no distrito de luz vermelha local. Como uma história paralela, eles retratam meu pai como um homem rico e excêntrico que mantinha uma jaguatirica em seu escritório, na época que cortejava a minha mãe. A versão deles da história dos meus pais estava portanto errada no tempo e no contexto. Naquela época, meus pais já eram casados havia mais de dez anos, e foi depois do casamento que meu pai progrediu financeiramente na vida.
É verdade que a TV Globo tentou entrar em contato conosco nos anos 1990 sobre seus planos, mas não sei se eles estariam interessados em corrigir a sua história, baseada num livro de Roberto Drummond, no qual a história também não retratava a verdade. E nós certamente nos recusamos a falar com eles. Notícias sórdidas vendem mais.
Voltando ao caderno de poesia da minha mãe, encontrei outro poema com a letra do meu pai e assinado por ele. Eram versos inacabados, intitulados “Clara”. Eu terminei o poema e aqui o apresento.
Clara
Clara tão pura,
Branca da lua,
Alva escura.
Sombras e cores
Do amanhecer.
Seu amor é um conto,
Palavras de Arrian,
Os sons de um encanto.
Escutais minha voz!
Cada entardecer,
Silêncio tranquilo,
Que eu voltarei.
Antônio de Luciânia, 1936
As duas
irmãs de minha mãe se chamavam Branca e Arria, e um de seus irmãos se chamava Magno. Na minha busca para descobrir por que a irmã de minha mãe se chamava Arria, um nome tão incomum, também descobri por que o
irmão mais velho dela se chamava Magno.
Meu avô materno, que morreu antes de eu nascer, era um homem culto e um grande leitor. Descobri que, na época do nascimento de seus filhos, um livro sobre a vida de Arrian, escritor romano e comandante militar, foi publicado e se tornou um best-seller no Brasil.
Arrian de Nicomedia – que viveu por volta de 86 DC - c. 160 – , cujo nome era Lucius Flavius Arrianus, também apelidado de Xenofonte, foi um romano de origem grega. Em português, é denominado Arriano de Nicomédia. Ele foi historiador, funcionário público, comandante militar e filósofo do período romano do século 2. Arrian também foi o autor de Anabasis de Alexandre, que é talvez o seu trabalho mais conhecido, e geralmente é considerado uma das melhores fontes de informação sobre as campanhas de Alexandre, o Grande, ou Alexander Magnus. Isso indicaria a fonte dos nomes dos irmãos de minha mãe? Possivelmente.
Mapa de Minas Gerais, com a localização de São Gotardo e foto da cidade.
No início dos anos 1950, meu pai já era dono de negócios em várias partes do Estado de Minas Gerais e possuía pequenos aviões, nos quais costumava voar, principalmente sozinho, para sua refinaria de açúcar e para outras casas de campo. Ele também contava com um piloto conhecido como Geraldão, encarregado dos cuidados gerais e manutenção de sua pequena frota de aeronaves.
Pelo que ouvi, esse aviador era uma pessoa com uma personalidade muito expansiva, e propenso a violar os rígidos códigos de radiocomunicação quando contatava as torres dos vários aeroportos dos quais se aproximava. Por exemplo: em uma ocasião em que chegou ao Rio, ou talvez fosse Brasília, ele simplesmente anunciou a uma torre de controle, cujo controlador ficou muito desconcertado, que era o piloto do Dr. Luciânia e estava já pousando. Aparentemente, ele fez isso sem esperar pela permissão habitual, mas apenas manobrou seu avião pelo primeiro espaço aéreo disponível sem mais delongas. Não é de surpreender que meu pai e Geraldão se desentenderam. Meu pai, provavelmente decidiu que não podia mais aguentar os acessos histriônicos do aviador, e então, compôs uma mensagem de demissão, em verso, para ser entregue ao seu funcionário!
Geraldão
Piloto Geraldão
Muito gordão,
Muito pesadão,
E muito trapalhão.
Tire a mão
Do meu avião,
E após avisão,
Suma então.
Antônio de Luciânia, 1965
Que tal ser demitido com um poema? Isso mostra que os dois não eram convencionais. Quando comecei a pesquisar para este livro, tentei encontrar
Geraldão, pensando que ele poderia ser guardador de algumas histórias engraçadas que pudessem contribuir para a saga da família. Infelizmente, fui informada de que ele havia morrido há muitos anos. E a vida continua.
Agora, Anastásia, a narradora, se distancia do presente e tenta visualizar sua história como vista por um leitor no futuro: quem eram essas pessoas? Qual era o mundo em que viviam?
Então, localizarei nosso mundo no tempo e no espaço.
Situado no interior do sudeste do Brasil, o Estado de Minas Gerais é principalmente montanhoso, e algumas de suas montanhas são quase inteiramente de minério de ferro. A descoberta de veios de ouro em 1693 causou um afluxo de novos colonos para a área, onde também foram encontradas pedras preciosas, especialmente diamantes nas rochas de itacolomito da região.
A família de minha mãe morava na cidade de Diamantina, localizada nas montanhas da parte oeste do estado. Pude encontrar vestígios de seus ancestrais paternos em Minas Gerais desde o século 17.
Os Fernandes de Oliveiras e os Baptistas vieram de Portugal numa época em que grandes fortunas estavam sendo feitas com as descobertas de ouro e diamantes. A história de suas famílias ao longo dos anos seguiu a mesma sequência de grandes riquezas à estagnação. Ainda não é absolutamente certo se o nome Cattapreta veio de Portugal ou foi criado e adotado localmente a partir do nome de uma mina. Pessoalmente, acredito que se originou de uma mina aurífera na região de Ouro Preto, onde o ouro era encontrado envolto em rocha vulcânica preta.
Foi principalmente na primeira metade do século 19 que famílias de outros países foram autorizadas a entrar nos ricos distritos de mineração. As famílias então presentes na região eram: os Dayrell, que vieram da Inglaterra, os Brants, originalmente Brandt, da Alemanha, e os Dumont e Renault da França, entre muitos outros. Os membros dessas famílias acabaram se casando com famílias locais de extração portuguesa, assim diversificando a composição cultural.
Minha avó materna, nascida Teresa Dayrell, viveu para ver na casa dos avós os restos da antiga riqueza dos Fernandes de Oliveiras. Mas na época do nascimento de minha mãe, em 1916, as minas locais haviam se esgotado há muito tempo e a cidade já passara o seu período de riqueza e opulência.
Na década de 1920, a família Dayrell Cattapreta decidiu se mudar para Belo Horizonte, a nova capital do estado. Instalaram-se confortavelmente em uma das lindas casas antigas da arquitetura colonial, situada na Avenida João Pinheiro, onde os galhos amplos das árvores flamboyant sombreavam a suave inclinação da via com suas folhas de confete flutuando na brisa. Foi minha avó Teresa quem me contou as histórias de sua família em Diamantina e também de sua vida na avenida inclinada de Belo Horizonte, onde flores vermelhas desabrochavam na primavera.
Enquanto isso, encontrei sinais da família Pereira de Azevedo já na primeira metade do século 16, na cidade do Porto, no norte de Portugal, onde eram comerciantes prósperos. Mais precisamente, os Azevedo eram uma família nobre na localidade, e os Pereira, provavelmente cristãos-novos ricos.
Alguns dos Pereira de Azevedo mudaram-se para o Novo Mundo em meados do primeiro século da ocupação portuguesa, já que, após a década de 1560, houve um aumento do fluxo de pessoas de Portugal para a colônia, como consequência da criação do primeiro governo-geral.
Encontrei registros do nascimento de Antônio Pereira de Azevedo em uma família baiana já proeminente em Salvador, na última década do século 16. Esse Antônio ficou conhecido como o Bahiano, ou Antônio, o Grande, e participou das 'Bandeiras', ou expedições de bandeira, nas partes desconhecidas dos novos territórios. E esse era o nome da família do meu avô paterno até meados do século 19.
Mas ainda demoraria muito tempo até que os Pereira de Azevedo se aventurassem ao oeste de Minas Gerais, onde eu, Anastásia, num dia no futuro distante encontraria traços de seus passos, diretamente conectados à minha família.
Guaritas, a casa em que meu pai nasceu, em Minas Gerais,
perto de São Gotardo, coleção de fotos A.L.P. Gouthier.
A outra metade da família de meu pai, ou os antepassados de minha avó paterna, Olympia de Rezende – foi muito mais fácil de localizar. Em 1939, sua história foi totalmente documentada por um membro da família, desde o final do século 17 nos Açores até o Brasil.
No início do século 18, os Rezende aproveitaram as doações de terras, conhecidas como Sesmarias, oferecidas no Novo Mundo, e navegaram para o Rio de Janeiro. De lá, alguns deles se mudaram para o interior, para um local no Estado do Rio, que leva o nome, e outros viajaram para Lagoa Dourada, no Estado de Minas Gerais.
Em meados do século 19, um ramo da família comprou a casa antiga, conhecida como Guaritas, localizada nos vales férteis do estado – uma área repleta de índios Botocudos e de escravos fugidos, os quais viviam em quilombos.
Os Pereira de Azevedo estão, portanto, entre os primeiros a chegar após a invasão portuguesa de 1500. E agora, tendo descoberto uma mulher Botocuda do povo Krenac na linhagem do lado de meu pai, percebo que esta foi minha terra, por direito, muitos milhares de anos antes da chegada dos portugueses. Acredita-se que os Krenac chegaram ao que se tornaria o Brasil 12.000 anos atrás.
No entanto, chegou o dia em que Anastásia, sua narradora, sentiu-se oprimida pela animosidade do povo da cidade onde sua família morava. Ela escolheu buscar a paz de espírito e o anonimato na Inglaterra, a terra de sua avó materna, completando assim um círculo migratório completo.
Como dizem:
“Quem luta e foge, pode voltar a lutar outro dia;
Mas o que morre na batalha, nunca se levantará outra vez.”
Tacitus.
Felizmente, embora existam tantos refugiados por diversos motivos em várias partes do mundo, as migrações hoje em dia não precisam mais ser deslocações permanentes, como na época colonial, condenando as pessoas a se afastarem de todos os aspectos da vida que conheciam antes. Da minha parte, como não queria abandonar meu passado, muitas vezes voltei para minha casa. Mas, tomando ações positivas para proteger e melhorar minha qualidade de vida, ampliei meus horizontes para um mundo maior.
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